Ato I

01-10-2010 21:11

 

CENA I

 

Londres. Na antecâmara do palácio. Entra por uma porta o Duque de Norfolk; por outra, o Duque de Buckingham e Lorde Abergavenny.

 

BUCKINGHAM — Feliz encontro e venturoso dia. Como passastes desde que nos vimos ultimamente em França?

NORFOLK — A Vossa Graça muito agradeço. Com saúde, e sempre admirador de quanto vi por lá.

BUCKINGHAM — Um acesso de febre inoportuna me fez ficar no quarto prisioneiro, quando esses sóis da glória, luminares da humanidade, em Ardres se encontraram.

NORFOLK — Foi entre Guines e Ardres. Eu me achava presente e os vi saudarem-se a cavalo; contemplei-os depois, quando se apearam, e abraçarem-se os vi de tal maneira, como se confundidos estivessem. E se assim fosse, mesmo, onde acharíamos quatro tronos que, postos na balança, eqüivalessem a esse trono duplo?

BUCKINGHAM — Todo esse tempo eu prisioneiro estava no meu quarto de doente.

NORFOLK — Então perdestes a visão do que a terra tem de grande. Poder-se-ia dizer que até aquela hora solteira estava a pompa e que nesse ato com algo se casou acima dela. Cada dia vencia os anteriores, até que chegasse o último e deixasse como próprio o prodígio deles todos. Quando os franceses, somente ouro e brilho, como deuses pagãos nos ofuscavam, no dia imediato nós fazíamos da Grã-Bretanha a Índia: qualquer homem que se alçasse, uma mina parecia. Os anõezinhos pajens dir-se-iam querubins, todos de ouro; as próprias damas, não afeitas à lida, quase suavam sob o peso do orgulho, de tal forma que o trabalho de enfeite lhes servia. Se qualquer mascarada se dissesse incomparável, a da subseqüente noite a deixava estúpida e mendiga. Cada um dos dois monarcas, de igual lustre, mais ou menos brilhante se ostentava, conforme aparecesse. Era louvado de per si qualquer deles; quando juntos, dizia-se que um só se percebia, não se atrevendo os próprios entendidos a confrontá-los nunca, que esses astros — pois assim lhes chamavam — desafiavam, por seus arautos, para as altas justas seus espíritos nobres, realizavam feitos além de quanto é concebível, de tal forma que as fábulas de antanho, como possíveis tendo-se afirmado, ganharam novo crédito, levando-nos a ter por certo o que nos conta Bevis.

BUCKINGHAM — Oh! ides muito longe.

NORFOLK — Tão verdade como em ser nobre e a honestidade na honra procurar sempre: os diferentes lances dessa festa algum brilho perderiam nos mais altos discursos, pois para eles a melhor língua era dos próprios feitos. Tudo ali era real; nenhuma parte colidia com outra; a ordem fazia ressaltar tudo, executando todas as funções seu papel à maravilha.

BUCKINGHAM — Quem dirigiu, pergunto, quem, segundo vossa opinião, reuniu o corpo e os membros dessa esplêndida festa?

NORFOLK — Alguém, decerto, que inclinação nenhuma demonstrara para um negócio desses.

BUCKINGHAM — Por obséquio, milorde, quem fez isso?

NORFOLK — Regulado foi tudo pelo engenho extraordinário do muito reverendo Cardeal de York.

BUCKINGHAM — O diabo que o carregue! Em todo bolo mete o dedo ambicioso. Que tinha ele que ver com tanto excesso de vaidade? Espanto-me de ver que uma montanha de sebo, só com seu volume, possa os raios absorver do sol benéfico e da terra desviá-los.

NORFOLK — Certamente, senhor, há nele estofo que assegura tão grande resultado, pois o apoio não tendo de linhagem mui notória, cujo prestígio abre caminho aos netos, nem havendo prestado altos serviços à coroa, nem tendo como aliadas pessoas de valor, mas, como a aranha que de si própria tece a fina teia, prova que é a força de seu próprio mérito que lhe franqueia a estrada, dom celeste que um lugar lhe assegura junto ao trono.

ABERGAVENNY — O que lhe deu o céu, não sei dizê-lo; que olhar mais penetrante isso descubra. Mas seu orgulho posso ver, que espia por todos os seus traços. De onde o obteve? Se não do inferno, é que é mesquinho o diabo, ou já deu quanto tinha, e ele outro inferno dentro de si se pôs a criar de novo.

BUCKINGHAM — Nessa excursão de França, por que diabo chamou a si o encargo, à revelia do rei, de designar os que deviam constituir seu séqüito? Ele mesmo a lista preparou dos gentis-homens, de maneira geral só escolhendo os a que ele pretende impor um fardo muito grande para honra secundária. Uma simples cartinha de seu punho — sem consulta ao Conselho generoso — faz do destinatário auxiliar dele.

ABERGAVENNY — Sei de parentes meus — três, nesse caso, pelo menos, se encontram — que com isso de tal modo esgotaram seus haveres, que jamais poderão voltar ao prístino bem-estar da família.

BUCKINGHAM — Oh! muita gente teve a espinha quebrada pelo peso de suas propriedades, só para irem nessa imponente viagem. Tanta mostra de vaidade, no entanto, tão-somente serviu para animar umas conversas de consistência nula.

NORFOLK — É pesaroso que eu penso que essa paz entre os franceses e nós não vale quanto nos custou.

BUCKINGHAM — Não houve quem, depois da tempestade que veio logo após, não se sentisse como inspirado e, sem consulta prévia, não fizesse, de pronto, a profecia de que essa tempestade, assim tirando da paz o tênue véu, só pressagiava sua ruptura súbita.

NORFOLK — É bem claro, pois já quebrou a França o compromisso e embargou em Bordéus a carga toda de nossos mercadores.

ABERGAVENNY — Foi por isso que nosso embaixador foi despedido?

NORFOLK — Sim, sem dúvida alguma.

ABERGAVENNY — Belo pacto, comprado por um preço exorbitante.

BUCKINGHAM — E todo esse negócio, dirigido foi por nosso cardeal mui reverendo.

NORFOLK — Perdoe-me Vossa Graça, todo o Estado conhecimento tem da desavença que entre vós e o cardeal há muito existe. Assim, vos aconselho — e aceitai isto de um coração que vos deseja apenas honra e prosperidade muito sólida — considerardes como equivalentes o poder do cardeal e sua astúcia; e mais: que a tudo quanto seu grande ódio deseje pôr em prática, não há de faltar nunca o instrumento sempre a jeito. Não ignorais a natureza dele; sabeis que é vingativo, e eu tenho ciência de que sua espada é de mui fino corte. E comprida; podemos dizer, mesmo, que alcança longe; e onde atingir não possa, decidido ele a joga. No imo peito guardai este conselho, pois haveis de achá-lo salutar. Eis que vem vindo a rocha que evitar vos aconselho.

(Entra o Cardeal Wolsey; a bolsa é trazida na sua frente; alguns guardas e dois secretários com papéis o seguem. De passagem, o cardeal e Buckingham trocam olhares desdenhosos.)

WOLSEY — Olá! O processo do inspetor do Duque de Buckingham está ai?

PRIMEIRO SECRETARIO — Aqui se encontra, senhor.

WOLSEY — E ele está pronto, pessoalmente?

PRIMEIRO SECRETARIO — Sim, quando a Vossa Graça for servido.

WOLSEY — Bem; depois trataremos desse assunto. Buckingham vai baixar o olhar altivo.

(Sai Wolsey com seu séquito.)

BUCKINGHAM — Esse cão de açougueiro tem a boca venenosa e eu não posso amordaçá-la. Assim, não despertá-lo é aconselhável. O livro do mendigo tem vantagem sobre o sangue de um nobre.

NORFOLK — Como assim! Ficastes exaltado? É conveniente pedir a Deus moderação, que é o único remédio que reclama vossa doença.

BUCKINGHAM — Li algo contra mim nos olhos dele. Seu olhar me humilhou, como ao mais ínfimo dos servos, e ora mesmo me traspassa traiçoeiramente. Foi falar com o rei; sigo-lhe já no encalço, para os olhos obrigá-lo a baixar.

NORFOLK — Parai, milorde, e que vossa razão com vossa cólera se ponha a discutir sobre esse intento. Quem altos montes galga, de começo progride lentamente. A zanga é como um cavalo ardoroso que, podendo seguir por onde queira, o próprio fogo logo o deixa cansado. Na Inglaterra não há quem poderia aconselhar-me como vós; sede pois para vós mesmo o que seríeis para vosso amigo.

BUCKINGHAM — Vou procurar o rei, e pela boca da honra aos gritos farei que a empáfia desse tipo de Ipswich ao pó lançada seja; se não, proclamarei que se anularam todas as diferenças entre os homens.

NORFOLK — Sede sensato, não deixando quente por demais a fornalha do inimigo, para que não venhais a cair nela. Ultrapassar podemos, por excesso de rapidez, a meta a que almejávamos, perdendo-a, assim, por esse próprio excesso. Como o sabeis, a chama que o licor faz subir na vasilha e derramar-se, parecendo aumentá-lo, o esgota apenas. Sede sensato, torno a aconselhar-vos. Na Inglaterra não há cabeça alguma capaz de dirigir-vos como a vossa, se quiserdes com a seiva da prudência, quando não apagar, deixar mais brando o fogo da paixão.

BUCKINGHAM — Senhor, por isso vos fico agradecido; vou guiar-me por vossa prescrição. Mas esse tipo arqui-orgulhoso — não me leva o excesso de cólera a nomeá-lo desse modo, mas honesta emoção — por muito certos indícios, provas claras como as fontes no mês de julho, quando distinguimos no fundo os grãos de areia, tenho em conta de corrupto e traiçoeiro.

NORFOLK — Não “traiçoeiro”; não digais isso.

BUCKINGHAM — Vou dizê-lo ao rei, e minhas provas hão de ser tão fortes como praia de rocha. Sede atento. Esta santa raposa, ou lobo, ou ambos — pois tão voraz ele é quanto astucioso, e tão propenso a excogitar maldades, a executá-las sempre, de alma e posto que reciprocamente se infeccionam, contanto que estadeie aqui e em França toda essa pompa — ao nosso soberano sugeriu esse pacto tão custoso, essa entrevista que absorveu tesouros de tal valia e que acabou partindo-se, qual vidro ao ser limpado.

NORFOLK — É certo, é certo, por minha fé; fez isso.

BUCKINGHAM — Por obséquio, senhor! Esse cardeal astuto e fino redigiu os artigos do contrato como bem entendeu, tendo sido eles ratificados com ter declarado: “Faça-se assim!” Mas são tão úteis como muletas para um morto. Pouco importa! Foi o conde-cardeal o autor de tudo; o digno Wolsey, que errar não pode nunca, foi quem fez isso. Mas o que se segue — que a meu ver é uma espécie de ninhada da velha mãe Traição — é apenas isto: Carlos, o imperador, sob o pretexto de vir ver a rainha sua tia — foi apenas pretexto, que, em verdade, veio ele para cochichar com Wolsey — fez-nos uma visita. Ele temia que do encontro marcado entre os monarcas da Inglaterra e da França lhe pudesse surgir qualquer prejuízo, que, em verdade, nessa liga ele via qualquer coisa que podia ameaçá-lo. Assim, com nosso cardeal ele tratou muito em segredo — como imagino, sim, tenho certeza, pois convencido estou de que o monarca pagou antes de obter o prometido, com o que teve a intenção assegurada bem antes de enunciá-la. — Em suma, havendo franqueado a estrada e de ouro atapetado, desta arte o imperador manifestou-se: que nele estava obter que o rei o curso desviasse da política e o contrato de paz viesse a romper. É necessário que o rei saiba — e por mim virá a sabê-lo — que o cardeal deste modo compra e vende a honra do reino, e tudo em seu proveito.

NORFOLK — Entristece-me ouvir tais coisas dele; desejara saber que há nisso equívoco.

BUCKINGHAM — Não, nem no menor ponto; apresentei-o com os verdadeiros traços com que ele há de desmascarado ser dentro de pouco.

(Entra Brandon, precedido de um sargento de armas.)

BRANDON — Vosso ofício, sargento, executai-o. É convosco, senhor Duque de Buckingham e Conde de Hereford, Stafford e Northampton; em nome de nosso alto soberano, por crime de traição eu te detenho.

BUCKINGHAM — Milorde, sobre mim caiu a rede; a vida perco por traição e astúcia.

BRANDON — Pesa-me ver-vos sem a liberdade e ter de ao fim levar esta incumbência. A determinação de Sua Alteza é que sejais levado para a Torre.

BUCKINGHAM — Protestar inocência fora inútil; a mancha que em mim pesa deixa negra minha própria brancura. Seja feita a vontade do céu, agora e sempre. Obedeço. Oh! adeus, adeus, milorde de Abergavenny.

BRANDON — Não; ele também vos fará companhia.

(A Abergavenny.)

É da vontade do monarca que vades para a Torre até poderdes ser certificado do que ele decidir.

ABERGAVENNY — Tal como o duque, também direi que em tudo seja feita a vontade do céu, e obediente me declaro ao prazer do soberano.

BRANDON — Ordem expressa aqui trago do rei para a prisão de Lorde Montacute, devendo, após, prender João de la Car, o confessor do duque, um tal Gilberto Peck, seu chanceler...

BUCKINGHAM — Bem, bem; os membros dessa conspiração. É tudo, creio.

BRANDON — Há um monge cartuxo.

BUCKINGHAM — Como! Como! Nicolau Hopkins?

BRANDON — Esse.

BUCKINGHAM — É um miserável meu intendente. O cardeal imenso lhe ofereceu dinheiro. Tenho os dias contados; sou a pobre sombra, apenas, de Buckingham, que neste instante a forma de uma nuvem assume, para escuro deixar meu claro sol. Milorde, adeus.

(Saem.)


 

CENA II

 

Sala do Conselho. Entra o rei, apoiado no ombro do cardeal, os nobres do Conselho, Sir Tomás Lovell, oficiais e pessoas do séquito. O cardeal vai sentar-se aos pés do rei, ao lado direito.

 

REI HENRIQUE — Sim, toda a minha vida, do mais fundo do coração vos agradece tanto cuidado e vigilância. Eu me encontrava na iminência de ser estraçalhado pela deflagração de uma conjura. Mas frustraste-la; muito agradecido. Trazei a nossa frente o gentil-homem da família de Buckingham; desejo ouvi-lo pessoalmente. Vai contar-me mais uma vez, sem discrepância alguma, as traições de seu amo.

(Ouvem-se vozes, dentro: “Passagem para a rainha!” Entra a Rainha Catarina, introduzida pelos Duques de Norfolk e de Suffolk. Ela ajoelha-se. O rei se alça do trono, levanta-a, beija-a e fá-la sentar-se ao seu lado.)

RAINHA CATARINA — Não; preciso ficar de joelhos? vim como pedinte.

REI HENRIQUE — Levantai-vos e, ao nosso lado, vinde tomar vosso lugar. Não é preciso que nos digais metade do pedido. A metade possuís de nosso mando; sem ser pedida, a outra metade é vossa. Dizei o que quereis, que já está feito.

RAINHA CATARINA — Muito agradeço a Vossa Majestade. Que vos ameis e, nesse grande afeto, não deixeis nunca de atender vossa honra, nem de vosso alto posto a dignidade, o objeto constitui de meu pedido.

REI HENRIQUE — Senhora, continuai.

RAINHA CATARINA — Tenho-me visto solicitada por não poucos súditos, os de maior apreço, que se queixam de grandes aflições que todos sofrem. Para eles comissões têm sido enviadas que o coração estraçalhar conseguem da lealdade de todos. E conquanto, meu bom Lorde Cardeal, eles dirijam contra vós as censuras mais acerbas, de serdes o fautor dessas violências, o rei, nosso senhor — que o céu conserve seu nome isento de qualquer vileza! — escapar não consegue dos discursos desrespeitosos, sim, dessa linguagem que os flancos arrebenta da lealdade e quase em rebelião se manifesta.

NORFOLK — Não “quase”; manifesta-se, realmente. Pois sob esses impostos tão pesados, todos os fabricantes de tecidos, sustentar não podendo tanta gente, em massa despediram seus fiandeiros, pisoeiros, tecelões e cardadores, que, incapazes de uma outra atividade, pela fome acossados, sem recurso, premidos pelo desespero, os fatos atacam pela frente. Todos se acham presentemente em franca rebelião, servindo em suas filas o perigo.

REI HENRIQUE — Impostos? De que espécie? Quais são eles? Senhor cardeal, que vos achais conosco censurado igualmente por tudo isso, que sabeis a respeito desse imposto?

WOLSEY — Se o permitis, senhor, conheço apenas uma pequena parte dos negócios relativos ao Estado e me coloco junto dos outros que comigo marcham.

RAINHA CATARINA — Sim, milorde, é verdade: mais que os outros não sabeis; mas sois vós o autor de coisas que do conhecimento são de todos e que não são saudáveis para quantos ignorá-los de todo quereriam, mas forçados se vêem a conhecê-las. Sim, essas exações, de que informado quer ser o soberano, só o ouvi-las nos causa mal as ouças; suportá-las... não resistimos sob o peso delas. Dizem que fostes vós o autor da idéia; não sendo assim, estais sendo inculpado por maneira mui grave.

REI HENRIQUE — Como! Como! Mais exações? Vejamos: de que espécie? De que espécie são elas?

RAINHA CATARINA — Grande risco existe em pôr a prova, desse modo, vossa paciência; mas encontro apoio na promessa de Vossa Majestade, de que me perdoaria. A geral queixa provém das comissões, que deles todos exige a sexta parte dos haveres, que arrecadada tem de ser com urgência, sendo o pretexto que para isso alegam, vossas guerras na França. Isso dá pábulo às línguas atrevidas; longe as bocas cospem todo o respeito e se congela nos frios corações toda a lealdade. Onde moravam preces, moram pragas, chegando tudo ao ponto de que a dócil obediência em escravo transformou-se da vontade exaltada. Desejara que sem delongas Vossa Alteza desse a máxima atenção a esse negócio. Mais urgente não há.

REI HENRIQUE — Por minha vida, contraria isso tudo nosso gosto.

WOLSEY — Por mim, não fui mais longe nisso tudo do que por meio de um singelo voto, só o tendo dado após o assentimento de juizes ponderados. Se acusado estou sendo por línguas ignorantes que, sem nada saberem de meus planos e de minha pessoa, de meus feitos em crônica se arvoram, permiti-me dizer-vos que essa é a sorte de meu posto, a vereda de espinhos que a virtude terá de atravessar. Não é possível coibir-me de fazer o que é preciso, com medo de ir bater nos maliciosos censuradores, que procedem sempre como peixes vorazes, que na esteira se põem de barco de recente fábrica, embora outra vantagem não consigam, além da inveja inútil. Muitas vezes o que fazemos de melhor, no juízo dos fracos ou maldosos julgadores, feito não foi por nós, ou implica abuso, e nossos piores atos — é freqüente — interpretados por grosseiro espírito, são proclamados como grandes feitos. Se imóveis nos pusermos, pelo medo de que possam zombar de nossos passos, ou cobri-los de opróbrio, criaremos raiz onde estivermos, ou ficamos na posição de estátua, simplesmente.

REI HENRIQUE — A ação louvável, feita com cuidado, a si mesma se isenta de censura, mas de temer em suas conseqüências é a que não acha apoio no passado. Em algum precedente vos baseastes para tal exação? Em nenhum, creio. Arrancar não devemos nossos súditos de nossas leis, nem menos amarrá-los ao nosso despotismo. A sexta parte dos haveres? Que imposto apavorante! É como se tirássemos das árvores a copa, a casca e parte, até, do tronco; muito embora as raízes lhes deixássemos, mutilada a esse ponto, o ar absorvera, sem falta, toda a seiva. Que se enviem cartas nossas a todos os condados em que houve lançamento desse imposto, perdão amplo anunciando a todos quantos à nossa execução se revoltaram. Por favor, cuidai logo desse assunto; deixo isso a vosso encargo.

WOLSEY (ao secretário) — Uma palavra muito em particular. Enviai missivas a todos os condados, anunciando graça e perdão da parte do monarca. É-nos contrário o povo desgostoso. Fazei, por isso, propalar o boato de que houve nossa interferência nessa revogação e no perdão de todos. Sobre esse assunto vos darei em breve maiores instruções.

(Sai o secretário.)

(Entra o intendente.)

RAINHA CATARINA — Sentida me deixou saber que o Duque de Buckingham caiu recentemente no vosso desagrado.

REI HENRIQUE — Muita gente, também, ficou sentida. É um gentil-homem muito instruído, orador de raros dotes, com quem foi liberal a natureza, de tal educação que poderia conselhos ministrar e ensinamentos aos mais conspícuos mestres, sem que nunca para si próprio ajuda procurasse. E, contudo, quando esses altos dotes não são bem aplicados, corrompida que a alma se torne, em vícios todos eles se transformam, dez vezes mais horrendos do que antes eram belos e atraentes. Esse homem tão completo, que alistado foi entre as maravilhas, que, do gozo de ouvi-lo nos fazia ter uma hora de conversa por um fugaz minuto; esse mesmo, senhora, às qualidades que lhe eram próprias emprestou roupagens monstruosas e ficou tão negro como se o próprio inferno o houvesse enegrecido. Ao nosso lado vinde ora sentar-vos. Ouvireis coisas — este gentil-homem já foi de sua inteira confiança — de deixar a honra triste. Ele que conte mais uma vez os fatos horrorosos de que fugir não poderemos nunca bastantemente, como não quiséramos sobre eles ouvir nada.

WOLSEY — Apresentai-vos e relatai com corajoso espírito, como compete a um súdito zeloso, quanto pudestes arrancar do Duque de Buckingham.

REI HENRIQUE — Com liberdade fala.

INTENDENTE — Primeiramente, como era costume dele, todos os dias empestava seu discurso dizendo que, no caso de vir o rei a falecer sem prole, arranjaria as coisas de maneira que o cetro a obter viria. Ouvi quando ele essas mesmas palavras disse ao genro, Lorde Abergavenny, a quem ele a jura fez de tomar vingança do cardeal.

WOLSEY — Observe Vossa Alteza a criminosa traça desse projeto. Não se achando com sua própria aspiração de acordo, profundamente hostil sua vontade se tornou contra vossa alta pessoa. Vai mais além: vossos amigos fere.

RAINHA CATARINA — Interpretai com caridade tudo, sábio Lorde Cardeal.

REI HENRIQUE — Vamos adiante. Como ele a presunção justificava, uma vez consumada nossa queda? Ouviste-o discorrer sobre esse ponto?

INTENDENTE — Foi levado a pensar dessa maneira por uma falsa e inútil profecia de Nicolau Hopkins.

REI HENRIQUE — Quem é esse Hopkins?

INTENDENTE — É um cartuxo, senhor, confessor dele, que a todos os momentos o alimenta com palavras de trono e de realeza.

REI HENRIQUE — E como soubeste isso?

INTENDENTE — Pouco tempo antes de Vossa Alteza ir para a França, na Rosa estando o duque, na paróquia de São Lourenço Poultney, perguntou-me que se falava em Londres dessa viagem. Temiam, respondi-lhe, uma perfídia por parte dos franceses, perigosa para nosso monarca. E logo o duque retrucou que em verdade havia causa para isso e que talvez se confirmasse certo dito profético de um monge de grande santidade, “que freqüentes vezes”, acrescentou, “me tem mandado recado para que eu autorizasse meu capelão, João de la Car, a assunto de relevância dele ouvir em hora previamente assentada. E após haver-lhe solenemente o capelão jurado, tal como em confissão, que quanto dele pudesse ouvir, a ser nenhum com vida, a não ser a mim mesmo, transmitira, com toda a gravidade e segurança disse ele devagar: Nem o monarca nem seus herdeiros — contai isso ao duque — poderão prosperar; que ele se esforce por ganhar o favor do povo miúdo. Reinar ainda há de o duque na Inglaterra”.

RAINHA CATARINA — Se estou bem informada, já estivestes como intendente dele, tendo o posto perdido pela queixa dos rendeiros. Tomai cuidado, para não manchardes uma nobre pessoa com vosso ódio, vindo a perder, assim, vossa nobre alma. Digo: tende cuidado; sim, concito-vos de todo o coração a fazer isso.

REI HENRIQUE — Deixai-o continuar; vamos, prossegue.

INTENDENTE — Só direi a verdade, por minha alma. Disse a milorde, o duque, que esse monge bem poderia vítima estar sendo das ilusões do diabo, e que era muito perigoso para ele demorar-se num pensamento desses até o ponto de formar algum plano que factível lhe parecesse, tal como acontece freqüentemente. Respondeu-me: “Cala-te! nunca isso poderá prejudicar-me”, tendo dito depois que se o monarca morrido houvesse na última doença, Sir Tomás Lovell e o cardeal teriam cortadas as cabeças.

REI HENRIQUE — Oh! que zelo! Há maldade nesse homem. Tens alguma coisa mais a contar?

INTENDENTE — Tenho, senhor.

REI HENRIQUE — Então, prossegue.

INTENDENTE — Achava-me em Greenwich, de uma feita, depois que Vossa Alteza censura fez ao duque, por motivo de Sir Guilherme Blomer...

REI HENRIQUE — Lembro-me ainda desse fato: sendo ele do meu feudo, entre os vassalos dele o pôs o duque. Bem; e depois?

INTENDENTE — No caso, disse-me ele, de eu ter sido mandado para a Torre por causa disso, como fora crível, representado houvera a mesma parte que meu pai quis representar no tempo do usurpador Ricardo: em Salisbury se achando, permissão pediu de à frente comparecer do rei. Caso tivesse sido atendido — e era pretexto as suas homenagens prestar-lhe — apunhalado haveria o monarca.

REI HENRIQUE — Oh gigantesco traidor!

WOLSEY — Que achais, senhora: poderia Sua Alteza viver tranqüilamente, estando esse homem livre?

RAINHA CATARINA — Possa tudo em Deus achar remédio!

REI HENRIQUE — Alguma coisa parece que ainda tens para contar-nos. Continua.

INTENDENTE — Depois de ter falado “na parte de meu pai” e, também, “faca”, pôs-se de pé e, a mão assim na espada, a outra no peito, levantando os olhos, soltou um juramento pavoroso, dizendo que se viesse a sofrer algo, tanto ao pai se adiantara, quanto dista da execução o plano irresoluto.

REI HENRIQUE — Era seu fim fazer de nosso corpo bainha para espada. Já está preso. Levai-o sem demora ao julgamento. Se puder encontrar na lei amparo, concedido há de sê-lo; do contrário, em nós não há de achá-lo. Oh! noite e dia! revela na traição grande mestria!

(Saem.)


 

CENA III

 

Um quarto no palácio. Entram o Lorde Camareiro e Lorde Sands.

 

CAMAREIRO — Como! Será possível que os encantos da França agora obriguem tanta gente a seguir essas modas arbitrárias?

SANDS — A moda, embora chegue a ser ridícula, indigna até dos homens, é seguida.

CAMAREIRO — Pelo que vejo, todas as vantagens que os ingleses ganharam nessa viagem não passam de uma ou duas carantonhas. Mas são horrendas; pois, ao assumi-las, poderíeis jurar no mesmo instante que seus narizes foram conselheiros de Pepino ou Clotário, tal a sua majestade e imponência.

SANDS — Todos eles têm pernas novas, porém sempre mancas. Quem nunca antes os visse andar, pensara que sofressem manqueira.

CAMAREIRO — Pela Morte, milorde! A roupa deles é de talho tão pagão, que é certeza haverem gasto tudo o que de cristãos possuíam antes.

(Entra Sir Tomás Lovell.)

Então, Sir Tomás Lovell! Que há de novo?

LOVELL — Por minha fé, milorde, não conheço novidade nenhuma, se tirarmos o edito que acabaram de afixar na porta do castelo.

CAMAREIRO — E seu objeto?

LOVELL — A reforma dos nossos perfumados viajantes, que de brigas deixam cheia a corte, de conversas e alfaiates.

CAMAREIRO — Isso me alegra. Agora pediria a esses monsieurs que aos cortesãos ingleses concedessem bom senso, embora nunca tivessem visto o Louvre.

LOVELL — É necessário — as condições são essas — que eles ponham de lado as plumas e demais tolices que trouxeram da França, juntamente com os muito honrosos pontos da ignorância que disso fazem parte, como duelos e fogos de artifício, o menosprezo de pessoas que valem mais do que eles e que alvo são do pedantismo exótico... Libertem-se da fé que têm no tênis, nas meias altas e calções com fofos, e todos esses símbolos da viagem, voltando a ser, como antes, gente honesta, ou as malas aprontem e retornem para os seus companheiros de loucura, onde eles poderão — é o que presumo — gastar cum privilegio o que lhes resta de impudicícia, à custa do ridículo.

SANDS — É tempo de lhes dar algum remédio; a doença está ficando contagiosa.

CAMAREIRO — Que perda para nossas damas, essa de tão raras vaidades!

LOVELL — Oh! decerto. Vai haver muito choro, meus senhores; esses bastardos astuciosos têm manha para fazer que as damas caiam: fazem grandes milagres.

SANDS — Que lhes sirva de rabequista o diabo! Bem, que partam todos eles, pois, é certeza, nunca virão a endireitar. Dagora em diante, qualquer fidalgo honesto da campanha, como eu, por tanto tempo conservado fora do jogo, poderá sua ária modesta apresentar e ser ouvido durante uma hora, sim, pela Madona, e até passar por músico aceitável.

CAMAREIRO — Muito bem, Lorde Sands; ainda tendes vossos dentes de leite.

SANDS — E conservá-los pretendo, enquanto me restar um coto.

CAMAREIRO — Para onde ides agora, Sir Tomás?

LOVELL — À casa do cardeal, e sei que Vossa Senhoria também foi convidado.

CAMAREIRO — Oh! decerto! Hoje à noite em casa dele vai haver um banquete de mão-cheia, para muitos fidalgos e senhoras. As belezas do reino hão de presentes estar à festa, posso asseverar-vos.

LOVELL — De coração magnânimo é esse príncipe da Igreja e mão fecunda como a terra, que alimento nos dá. Por toda parte se espalha o orvalho dele.

CAMAREIRO — É certo: é nobre. Boca negra há de ter quem outra coisa disser a seu respeito.

SANDS — Não lhe faltam razões, milorde, para ser magnânimo. No caso dele a economia fora pecado mais nocivo que a heresia. Os homens de seu timbre devem sempre ser liberais. O exemplo parte deles.

CAMAREIRO — Perfeitamente; porém poucos hoje dão tão grandes exemplos. Minha barca por mim espera; Vossa Senhoria irá comigo. Vamos, meu bondoso Sir Tomás; chegaremos atrasados; com Sir Henrique Guildford indicado fui para ser mordomo dessa festa.

SANDS — Fico às ordens de Vossa Senhoria.

(Saem.)


 

CENA IV

 

Sala no palácio de York. Oboés. Uma pequena mesa sob um dossel, para o Cardeal Wolsey; uma mesa grande para os hóspedes. Por uma porta entra Ana Bolena acompanhada de várias damas e senhoras de qualidade, como hóspedes; pela outra entra Sir Henrique Guildford.

 

GUILDFORD — Minhas senhoras, cordiais boas-vindas vos trago aqui por parte de Sua Graça. A todos vós e à distração dedica esta noite o cardeal, estando certo de que nenhum dos componentes deste nobre bando de casa trouxe a mínima preocupação. A todos ele almeja a alacridade que o bom vinho, as boas companhias e o bom acolhimento, de regra, a toda gente boa ensejam.

(Entram o Lorde Camareiro, Lorde Sands e Sir Tomás Lovell.)

CAMAREIRO — Ainda sois moço, Sir Henrique Guildford.

SANDS — Sir Tomás Lovell, se o cardeal tivesse metade, apenas, de meus pensamentos mundanos, asseguro-vos que muitas destas senhoras hoje encontrariam, antes de irem dormir, um bom refresco, oh! muito mais do agrado delas todas.

LOVELL — Se de uma ou duas Vossa Senhoria fosse hoje o confessor!

SANDS — Oh! quem me dera! Encontrariam branda penitência.

LOVELL — Branda, como?

SANDS — Tão branda quanto um leito de plumas ensejasse.

CAMAREIRO — Caras senhoras, não quereis sentar-vos? Sir Henrique, ficai daquele lado, que eu me encarrego deste. Sua Graça vem já. Não, não podeis ficar geladas; quando se sentam juntas duas damas, o tempo deixam frio. Lorde Sands, vós é que ireis deixá-las sempre espertas; vinde sentar-vos entre estas senhoras.

SANDS — Por minha fé, a Vossa Senhoria sou muito agradecido. Com licença, gentis senhoras.

(Senta-se entre Ana Bolena e outra dama.)

Se se der que eu fale com certo estouvamento, desculpai-me, que isso é herança paterna.

ANA — Ele era louco?

SANDS — Oh, em excesso! Louco, a conta inteira; no amor, também. Mas a ninguém mordia; como ora faço, poderia vinte beijos vos dar num fôlego.

(Beija-a.)

CAMAREIRO — Bem dito, milorde; agora, sim, estais sentado num bom lugar. A culpa, cavalheiros, será só vossa, se estas lindas damas daqui saírem com fechado rosto.

SANDS — Deixai-me só com o pouco que me toca.

(Oboés. Entra o Cardeal Wolsey, acompanhado, e vai sentar-se sob o dossel.)

WOLSEY — Sede bem-vindos, belos convidados. A gentil dama ou o nobre cavalheiro que não mostrar franca alegria agora, não tem amor a mim. Sede bem-vindos novamente. À saúde de vós todos.

(Bebe.)

SANDS — Vossa Graça é gentil. Dêem-me uma taça que conter possa os agradecimentos e um discurso me poupe.

WOLSEY — Lorde Sands, muito vos agradeço. Deixai ledas vossas vizinhas; não estão alegres. Cavalheiros, quem tem a culpa disso?

SANDS — Primeiro o rubro vinho há de subir-lhes, senhor, às belas faces, para que elas de tanto conversar nos deixem mudos.

ANA — Milorde Sands, sois um par alegre.

SANDS — Quando posso escolher a contraparte. Eis vinho para Vossa Senhoria. Se quiserdes beber... Porque se trata de uma coisa...

ANA — Que não podeis mostrar-nos.

SANDS — Não disse a Vossa Graça que haveriam de soltar logo a língua?

(Ouve-se toque de trombetas e de tambores; descarga de artilharia.)

WOLSEY — Que aconteceu?

CAMAREIRO — Alguém vá ver o que houve.

(Sai um criado.)

WOLSEY — Que ruído belicoso será esse? Que significará? Minhas senhoras, nada temais, pois tendes privilégios assegurados pelas leis da guerra.

(Volta o criado.)

CAMAREIRO — Então, que aconteceu?

CRIADO — Um nobre bando de estrangeiros, parece. Já saltaram do barco e se aproximam como grandes embaixadores de estrangeiros príncipes.

WOLSEY — Bondoso Lorde Camareiro, dai-lhes as boas-vindas, pois falais francês, e até nós os trazei, para que a todos este céu de belezas ilumine completamente. Alguns o ajudem nisso.

(Sai o Lorde Camareiro, acompanhado. Todos os convivas se levantam; são removidas as mesas.)

Tivestes o banquete interrompido; mas saberei remediar isso. Boa digestão a vós todos. E de novo vos dou as boas-vindas. Sois bem-vindos.

(Oboés. Entram o rei e outros fidalgos, mascarados e fantasiados de pastores, introduzidos pelo Lorde Camareiro. Dirigem-se diretamente para o cardeal e o saúdam graciosamente.)

Que nobre companhia. Que desejam?

CAMAREIRO — Pedem que diga a Vossa Graça, visto nenhum falar inglês, que, tendo ouvido pela alta Fama que uma companhia bela e nobre haveria de reunir-se neste ponto hoje à noite, não puderam menos de abandonar os seus rebanhos, movidos do respeito que à beleza sempre têm demonstrado, e sob o vosso patrocínio licença vos impetram para ver estas damas e uma hora de distração passar com todas elas.

WOLSEY — Dizei-lhes, Lorde Camareiro, que eles fazem muita honra à minha pobre casa; muito lhes agradeço e a todos peço que aqui procedam como bem quiserem.

(Cada um tira uma dama para dançar; o rei tira Ana Bolena.)

REI HENRIQUE — A mão mais bela que eu jamais toquei. Ó linda! Até hoje eu não te conhecera!

(Música. Dança.)

WOLSEY — Milorde!

CAMAREIRO — Vossa Graça?

WOLSEY — De minha parte, por favor, dizei-lhes que deve haver uma pessoa entre eles mais digna deste assento do que eu próprio, a quem, se a conhecesse, o cederia com meu amor e todo o meu respeito.

CAMAREIRO — Pois não, milorde.

(Os mascarados cochicham uns para os outros.)

WOLSEY — Que é que estão dizendo?

CAMAREIRO — Confessam que há, realmente, essa pessoa, mas querem que a descubra Vossa Graça, porque o lugar oferecido aceite.

WOLSEY — Vou tentar.

(Levanta-se de seu lugar.)

Cavalheiros, com licença: neste aqui faço a minha real escolha.

REI HENRIQUE (tirando a máscara) — Achaste-lo, cardeal. Encantadora companhia aqui tendes. Bem pensado. Sois um homem da Igreja; do contrário, cardeal, eu vos teria em mau conceito.

WOLSEY — Alegro-me por ver que Vossa Graça se mostra espirituoso.

REI HENRIQUE — Por obséquio, milorde camareiro, aproximai-vos: quem é aquela dama encantadora?

CAMAREIRO — Se me permite Vossa Graça, é filha de Sir Tomás Bolena, do Visconde de Rochefort; ela é dama da rainha.

REI HENRIQUE — Pelo céu, é adorável. Minha jóia, descortesia fora rematada tirar-vos para a dança sem beijar-vos. Um brinde, meus senhores! Bebam todos.

WOLSEY — Sir Tomás Lovell, pronto está o banquete na câmara privada?

LOVELL — Sim, milorde.

WOLSEY — Vossa Graça, receio-o, pela dança ficou algo animado.

REI HENRIQUE — Em demasia, tenho muito receio.

WOLSEY — Na outra sala, milorde, o ar é mais fresco.

REI HENRIQUE — Levem todos suas damas. Afável companheira, não poderei deixar-vos por enquanto. Alegremo-nos todos. Meu bondoso Lorde Cardeal, beber ainda pretendo meia dúzia de brindes com estas damas e novamente à dança concitá-las. Depois disso, cada um terá licença de imaginar que foi o de mais sorte. Vamos! que soe a música!

(Saem, com toque de trombetas.)

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