Ato III

01-10-2010 21:09

 

 

CENA I

 

O palácio de Bridewell. Um quarto dos aposentos da rainha. A rainha e suas damas de companhia estão trabalhando.

 

RAINHA CATARINA — Menina, vai buscar teu alaúde, que minha alma está aflita de cuidados. Se puderes, dispersa-os com teu canto. Larga o trabalho.

(Canção)
Com sua lira Orfeu fazia
dobrar-se a montanha fria
e os troncos, quando cantava.
Até, sem chuva e sem sol,
se via um lindo arrebol
e a primavera pompeava.

Ouvindo-o as coisas cantar,
as próprias ondas do mar
se quedavam pensativas.
Tem o canto tal condão
que as dores do coração
se tornam logo cativas.

(Entra um gentil-homem.)

RAINHA CATARINA — Que é que há?

GENTIL-HOMEM — Se Vossa Graça o permitir, encontram-se os dois grandes cardeais aí fora, à espera.

RAINHA CATARINA — Querem falar-me?

GENTIL-HOMEM — Tenho instruções deles para dizer que sim.

RAINHA CATARINA — Dizei-lhes que entrem.

(Sai o gentil-homem.)

Que quererão de mim, sendo eu tão pobre, uma fraca mulher, já sem prestigio? Quanto mais penso nisso, menos acho prazer nessa visita. Homens virtuosos deviam ser, de posição tão digna... Mas o hábito não faz o monge, é certo.

(Entram Wolsey e Campeio.)

WOLSEY — Paz para Vossa Alteza.

RAINHA CATARINA — Vossas Graças como dona de casa ora me encontram. O medo do futuro é que me obriga a estar em condições de fazer tudo. Reverendos senhores, qual a causa de quererdes falar-me?

WOLSEY — Se do agrado vos for, nobre senhora, passaremos para vosso aposento reservado, onde vos exporemos os motivos desta nossa visita.

RAINHA CATARINA — Mesmo aqui poderemos falar, pois, em consciência, até hoje nada fiz que não pudesse revelar francamente em qualquer parte. Prouvera ao céu que todas as mulheres pudessem declarar a mesma coisa com igual liberdade. Meus senhores, uma felicidade sempre tive: isso de não ligar nunca importância ao fato de meus gestos comentados serem por toda a gente, de ficarem sob a vista de todos, e como alvo dos ataques da inveja e da calúnia, tão certa me acho de ter vida limpa. Se vindes para examinar a minha conduta como esposa, sede francos. Sempre a verdade ama linguagem rude.

WOLSEY — Tanta est erga te mentis integritas, regina serenissima.

RAINHA CATARINA — Oh! nada de latim, meu bom senhor. Não tenho estado tão ociosa, desde minha chegada, que não aprendesse a língua dos que vivem no meu meio. Em língua estranha minha causa toma-se mais estranha e suspeita. Por obséquio, dai forma inglesa ao vosso pensamento. Se a verdade disserdes, as pessoas presentes vos serão agradecidas por sua pobre senhora. Acreditai-me: tratada tem sido ela rudemente. Lorde Cardeal, meu mais premeditado pecado pode ser perfeitamente absolvido em inglês.

WOLSEY — Nobre senhora, pesa-me ver que a minha integridade, e toda a devoção com que vos sirvo e a Sua Majestade só despertam suspeitas, apesar de toda a minha boa fé e lealdade. Aqui não vimos para acusar, para manchar uma honra que recebido tem somente bênçãos das almas bem formadas, nem, tampouco, para vos provocar novas tristezas — que é o que tendes bastante — mas apenas para ficarmos conhecendo como julgais a grave dissidência que houve entre o monarca e vós, e para dar-vos. — como pessoas livres e sinceras — nossa justa opinião e algum conforto.

CAMPEIO — Muito honrada senhora, o Lorde de York, movido por sua nobre natureza, pelo zelo e obediência que ele ainda professa a Vossa Graça, e já esquecido, por ser homem de bem, de vosso ataque contra ele próprio — muito longe, muito, vos deixastes levar — vos oferece, como o faço, os serviços e conselhos.

RAINHA CATARINA (à parte) — Para trair-me. (Alto.) Meus senhores, a ambos agradeço a intenção. Falastes como gente honesta — prouvera ao céu que o fôsseis! — Mas dar uma resposta tão de súbito sobre assunto de tanta gravidade, que tão de perto a honra vem ferir-me e muito mais, talvez, a própria vida... Com meu fraco juízo, diante de homens de tanta erudição e gravidade, com franqueza, não sei como fazê-lo. Encontrava-me em meio às minhas damas de companhia, longe — Deus o sabe — de pensar em visitas de tal porte e em semelhante assunto. Assim, em nome do que eu fui — pois percebo que se encontra no fim minha grandeza — a Vossas Graças suplico conceder à minha humilde causa um pouco de tempo e reflexão. Ah! sou uma mulher fraca, sem amigos, sem esperança alguma.

WOLSEY — Nobre dama, ofendeis a afeição do soberano com semelhante medo. Não têm número vossos amigos, vossas esperanças.

RAINHA CATARINA — Na Inglaterra, de quase nenhum préstimo. Acreditais, senhores, que um inglês se atreveria a dar-me algum conselho, dizer-se amigo meu, abertamente, contra o prazer agir de Sua Alteza — dado que houvesse algum desesperado que honesto se mostrasse — continuando, depois disso, com vida? Não, decerto. Os amigos que o fardo poderiam sopesar de meu grande sofrimento, em quem confiar de todo eu poderia, aqui não vivem. Todos eles, como qualquer outro consolo, muito longe se acham daqui, na minha própria pátria.

CAMPEIO — Desejaria que por uns instantes Vossa Graça deixasse essas tristezas e ouvisse meu conselho.

RAINHA CATARINA — Qual é ele, senhor?

CAMPEIO — À proteção do soberano confiar a vossa causa. Ele é bondoso e por demais amável. De vantagem fora para vossa honra e vossa causa, pois se vos atingir o legal juízo, desonrada saireis.

WOLSEY — É com acerto que ele vos aconselha.

RAINHA CATARINA — Ele aconselha o que ambos desejais: minha ruína. É um conselho cristão? Oh! que vergonha para vós ambos! Ainda há céu, lá no alto um juiz se encontra a que nenhum monarca poderá corromper.

CAMPEIO — Vossa paixão nos interpreta mal.

RAINHA CATARINA — Pois tanto pior para ambos. Eu pensava que ambos fôsseis homens santos; é certo, por minha alma, duas cardeais virtudes e eminentes. Mas ambos não passais, receio-o muito, de pecados cardeais, corações falsos. Que vergonha, senhores! Reformai-vos! Esse é o vosso consolo, o lenitivo que trazeis a uma dama desgraçada? a uma mulher perdida neste meio, ridicularizada, escarnecida? Nem a metade, ao menos, vos desejo das infelicidades que me oprimem. Tenho mais caridade. Mas lembrai-vos de que ora vos advirto. Tomai tento, pelo céu, porque o fardo de meus males sobre vós não recaia.

WOLSEY — Nobre dama, estais fora de vós; isso é delírio; em suspeita mudais os bons intentos.

RAINHA CATARINA — E vós a mim, em nada. Amaldiçoados sejam todos os falsos conselheiros como vós. Quereríeis — se piedade tivésseis, sentimento de justiça, se de membros da Igreja possuísseis alguma coisa mais do que a roupagem — que nas mãos minha causa eu depusesse de quem só me tem ódio? Ai! há que tempo da afeição do monarca estou banida, e também do seu leito! Já estou velha, meus senhores; agora só perdura de nossa ligação minha obediência. Que é que de pior podia acontecer-me além dessa desgraça? Vosso esforço me acarretou a maldição que vedes.

CAMPEIO — O pior é Vosso medo.

RAINHA CATARINA — Vivi tanto — deixai que eu mesma o diga, que a virtude com amigos não conta — como esposa dedicada e — declaro-o sem vanglória — sem que a suspeita nunca me tivesse lançado o seu ferrete; tendo sempre dedicado ao monarca o meu afeto; depois de Deus, amando-o; obedecendo-lhe, levando meu amor à idolatria, chegando mesmo, para ser-lhe amável, a descuidar das orações, e tudo para premiada ser desta maneira? Oh! é duro, senhores! Apontai-me uma mulher constante a seu marido, uma mulher que nunca uma alegria sonhado houvesse além do prazer dele, a após ter ela feito tudo, tudo, a meu favor um mérito eu reclamo: minha grande paciência.

WOLSEY — Nobre dama, fugis dos bons intuitos que nos movem.

RAINHA CATARINA — Não quero cometer, milorde, o crime de renunciar de grado ao nobre título que me ligou ao vosso soberano. Somente a morte pode divorciar-me de minha dignidade.

WOLSEY — Ora atendei-me.

RAINHA CATARINA — Antes o pé nunca eu tivesse posto no solo da Inglaterra. nem provado da lisonja que nele cresce tanto. Tendes o rosto de anjo, mas é certo que vossos corações o céu conhece. Qual será a sorte desta desgraçada? Não há mulher tão infeliz quanto eu.

(A suas damas de companhia.)

Ah, pobrezinhas! que futuro tendes, naufragadas num reino onde a esperança não medra, nem amigos, nem piedade; onde por mim não chora um só parente e onde mal me concedem um sepulcro! Como a açucena, outrora soberana dos campos, onde havia florescido, pendo a cabeça e morro.

WOLSEY — Se pudesse Vossa Graça chegar a convencer-se de que nossos intuitos são honestos, mais tranqüila ficara. Por que causa, boa dama, por que motivo havíamos de vos prejudicar? Ah! nossos postos, o caráter de nossa dignidade, nos impedem de tal. Curar as mágoas é nossa missão própria, não semeá-las. Pelo céu, refleti no que fizerdes, como podeis prejudicar-vos, como, com tal procedimento, poderíeis afastar-vos de todo do monarca. O coração dos príncipes dá beijos na obediência, a tal ponto gosta dela; mas, em frente aos espíritos teimosos, levantam-se, explodindo tão terríveis como as grandes tormentas. Estou certo de que sois de gentil e nobre gênio, de alma tão calma como o mar tranqüilo. Pelo que somos, por favor, tomai-nos: mediadores da paz, amigos, servos.

CAMPEIO — Senhora, haveis de convencer-vos disso. Prejudicais demais vossa virtude com esse medo de mulheres débeis. Um espírito nobre como o vosso rejeita essas suspeitas como moedas de cunho duvidoso. O rei vos ama. Cuidai de conservar sempre o amor dele. Se confiardes em nós, estamos prontos a provar nosso zelo de servir-vos.

RAINHA CATARINA — Fazei o que quiserdes, meus senhores, e desculpai-me, por favor, no caso de eu me ter comportado incivilmente. Sabeis que sou mulher e que careço da arte de conversar com propriedade com pessoas tão altas. Meus respeitos oferecei a Sua Majestade; fazei-me esse favor. Ele ainda é dono do coração que neste peito bate, e enquanto eu tiver vida, será dono de minhas orações. Vinde, mui dignos padres, aconselhai-me. Agora implora quem não pensou desde o primeiro dia que tão cara a realeza lhe sairia.

(Saem.)


 

CENA II

 

Antecâmara dos apartamentos do rei. Entram o Duque de Norfolk, o Duque de Suffolk, o Conde de Surrey e o Lorde Camareiro.

 

NORFOLK — Se em vossas queixas ora vos unirdes e com vossa insistência as reforçardes, ao cardeal resistir será impossível. Mas no caso de não aproveitardes esta oportunidade, só vos digo que tereis de agüentar novas desgraças, além das que já tendes.

SURREY — Rejubilo-me por achar ocasião, embora mínima, que lembrado me faz de que meu sogro, o duque, tem de ser vingado nele.

SUFFOLK — Qual dos pares não foi menosprezado por ele, ou, quando nada, por maneira sempre estranha, esquecido? Em que pessoa, tirante a própria, ao cunho da nobreza respeito ele mostrou?

CAMAREIRO — Falais, milordes, somente o que sentis. Sei bem o que ele de mim e vós merece; mas, se há modo de contra ele fazermos qualquer coisa, nesta oportunidade. é o que duvido. Se o caminho barrar-lhe não puderdes que vai ter até ao rei, não tenteis nada nesse sentido, pois a língua dele sobre o monarca exerce poder mágico.

NORFOLK — Oh! nada de receios! Seu feitiço sobre o rei já acabou. pois o monarca contra ele descobriu alguma coisa que há de estragar o mel de seus discursos de uma vez para sempre. Ele se encontra definitivamente mergulhado no desprazer do rei.

SURREY — Como eu ficara satisfeito de ouvir uma notícia como essa de hora em hora!

NORFOLK — É verdadeira, podeis acreditar. Sua conduta, dúplice, no divórcio está patente. Nisso ele apareceu como eu quisera que aparecesse meu pior inimigo.

SURREY — Como se descobriram seus embustes?

SUFFOLK — Do modo mais estranho.

SURREY — Oh! Como? Como?

SUFFOLK — A carta que o cardeal mandara ao papa se extraviou, vindo ter às mãos do rei, e o rei viu que o cardeal pedia instante a Sua Santidade que parasse com a sentença a respeito do divórcio, “porque, sendo alcançado“, acrescentava, “é certo o rei achar-se apaixonado por uma das criaturas da rainha, Ana Bolena”.

SURREY — O rei tem essa carta?

SUFFOLK — Ficai certo.

SURREY — E será de algum efeito?

CAMAREIRO — O rei, com isso, vê como ele corta direito ou se desvia nos caminhos de seus próprios intentos. Mas sobre isso falham todas as artes; o remédio chega depois da morte do paciente: o rei já desposou a bela dama.

SURREY — Oh, quem nos dera!

SUFFOLK — Possa esse desejo deixar-vos venturoso, pois afirmo-vos que já está realizado.

SURREY — Alegremente saúdo esse consórcio.

SUFFOLK — Digo amém.

NORFOLK — Como todos o fazem.

SUFFOLK — Já estão sendo dadas as ordens para a coroação. Mas isso é novidade muito fresca, não é para ser dita a toda a gente. Mas, meus senhores, ela é uma criatura realmente extraordinária, assim no espírito como na forma extrema. Estou convicto de que dela virá tal ou qual bênção para esta terra, digna de memória.

SURREY — E o rei vai engolir aquela carta do cardeal? Não permita Deus tal coisa.

NORFOLK — Com a breca! Amém.

SUFFOLK — Não, não! Há outras vespas que em torno do nariz lhe estão zumbindo, para apressar o efeito da picada. Sem despedir-se, o Cardeal Campeio partiu furtivamente para Roma. Não deu remate à causa do monarca. Foi despachado no papel de agente do nosso Cardeal Wolsey, para força dar a suas intrigas. Asseguro-vos que o rei disse “Ah!” ao ter notícia disso.

CAMAREIRO — Que Deus o deixe exasperado, para dizer “Ah!” com mais força.

NORFOLK — Mas, milorde, quando retorna Cranmer?

SUFFOLK — Já se encontra de volta, sempre fiel à sua antiga maneira de pensar, e, juntamente com os colégios de mais subida fama de toda a cristandade, justifica o divórcio do rei. Dentro de pouco, quero crer, o segundo casamento será tornado público, assim como a coroação da nova soberana. Catarina não mais será chamada de rainha, porém princesa e viúva do falecido Artur. Oh! esse Cranmer é um sujeito de peso; teve muito trabalho com os negócios do monarca.

SUFFOLK — Decerto; e ainda havemos de, por isso, vê-lo como arcebispo.

NORFOLK — Ouvi falar a esse respeito.

SUFFOLK — É certo. Eis o cardeal!

(Entram Wolsey e Cromwell.)

NORFOLK — Observai-o! observai-o! Está zangado.

WOLSEY — Entregastes ao rei o embrulho, Cromwell?

CROMWELL — No quarto de dormir; dei-lho em mão própria.

WOLSEY — Viu de que se tratava?

CROMWELL — Na mesma hora tirou o selo, e o que pegou primeiro leu com ar muito sério, revelando grande preocupação. Mandou dizer-vos que hoje bem cedo viésseis esperá-lo.

WOLSEY — Pretende sair logo?

CROMWELL — Penso que ele não deve demorar.

WOLSEY — Deixai-me agora por uns instantes.

(Sai Cromwell.)

(À parte.)

Deve ser a Duquesa de Alençon, irmã do Rei da França. É essa que ele há de escolher para esposa. Ana Bolena! Não, não quero para ele a Ana Bolena. Não basta ter uma bonita cara. Ora, Bolena! Não queremos nada com Bolena nenhuma. Que demora com as notícias de Roma! Ora, a Marquesa de Pembroke!

NORFOLK — Ele não está contente.

SUFFOLK — Talvez já saiba que contra ele a cólera o rei já está afiando.

SURREY — Ó Deus! deixai-a com bom corte, se fores justo em tudo.

WOLSEY — Dama de companhia da rainha, filha de um cavaleiro, ama da ama, rainha da rainha! Esta candeia não está dando chama muito clara. Tenho de espevitá-la. Então, que acabe. Tem mérito e é virtuosa... Mas, que importa? Sei que ela é luterana apaixonada. Não é saudável para nossa causa que ela repouse do monarca ao peito, que tão dificilmente é governado. Depois, apareceu recentemente um herético, um herético dos piores, esse Cranmer, que no ânimo do rei soube insinuar-se e agora é dele o oráculo.

NORFOLK — Alguma coisa o deixa preocupado.

SURREY — Desejara que fosse alguma coisa que lhe estragasse a corda, a corda mestra do coração.

(Entra o rei, lendo um codicilo, e Lovell.)

SUFFOLK — O rei! O rei vem vindo!

REI HENRIQUE — Que quantidade imensa de riquezas soube ele acumular para si próprio, e que enormes despesas a toda hora de suas mãos escoam. De que modo pode ele conciliar as duas coisas? — Então senhores, vistes o cardeal?

NORFOLK — Aqui nos encontrávamos milorde, a observá-lo. Algo estranho tem no cérebro: morde os lábios, assusta-se, detém-se subitamente, os olhos no chão crava e, de repente, leva o dedo à fronte; sem que se espere, ágil estuga os passos; depois, detém-se, o peito fere duro, volvendo a olhar mais uma vez à lua. Nas mais estranhas posições o vimos.

REI HENRIQUE — Pode ser que em revolta tenha o espírito. Papéis do Estado esta manhã mandou-me, conforme lhe pedira. Poderíeis acaso imaginar o que entre os mesmos fui encontrar, por pura inadvertência, posso vos garantir, da parte dele? O inventário, em verdade, relativo sua prataria, seus tesouros, finíssimos tecidos, ornamentos de sua casa que julga serem mostras de excessiva opulência, que ultrapassa de muito as posses de qualquer vassalo.

NORFOLK — O céu tem parte nisso; algum espírito decerto entre os papéis pôs essa lista para com ela os olhos abençoar-vos.

REI HENRIQUE — Se acreditar pudéssemos que suas meditações pairavam sobre a terra e alguma multa espiritual visavam, pudera prosseguir no devaneio. Mas receio que sejam sublunares suas idéias e, por isso, indignas de séria reflexão.

(Senta-se no trono e fala baixo a Lovell, que se dirige a Wolsey.)

WOLSEY — Deus me perdoe! Que o céu proteja sempre Vossa Alteza.

REI HENRIQUE — Meu bondoso senhor, mostrais-vos cheio de coisas celestiais e guardais na alma o inventário da graça mais preciosa, que decerto relíeis neste instante. Será difícil para vós, desse ócio pio tirar o mais fugaz momento para as contas terrestres. Considero-vos a esse respeito um péssimo intendente e alegre me declaro por achar-vos muito igual a mim mesmo neste ponto.

WOLSEY — Meu soberano, eu tenho um tempo para meus deveres sagrados, outro para dedicar aos negócios que me forem designados no Estado. A natureza, por sua vez, a fim de conservar-se, reclama alguns momentos que eu, por força, como seu filho frágil e no jeito de meus irmãos mortais, tenho de dar-lhe.

REI HENRIQUE — Palavras acertadas.

WOLSEY — Desejara que Vossa Alteza associasse sempre — como por merecê-lo hei de esforçar-me — com as palavras meus atos acertados.

REI HENRIQUE — Novamente bem dito; com acerto já procede quem fala desse modo. No entretanto, palavras não são atos. Meu pai vos estimava; assim dizia, tendo com os atos coroado o dito. Desde que o sucedi, sempre vos tive perto do coração. Assegurei-vos posições de proventos vantajosos. Mais: entrei em meu próprio patrimônio para vos estender meus benefícios.

WOLSEY (à parte) — Que quererá ele dizer com isso?

SURREY (à parte) — Deus faça prosperar este negócio.

REI HENRIQUE — Fiz de vós o primeiro homem do Estado, o primeiro, pois não? Dizei-me, peço-vos, se confirmais o que ora vos declaro. No caso de o fazerdes, respondei-nos se nos deveis obrigação por isso. Que nos dizeis?

WOLSEY — Meu digno soberano, confesso que as reais graças diariamente sobre mim derramadas ultrapassam de muito quanto eu vos fazer pudesse. Sim, vencem mesmo todo esforço humano. Sempre aquém meus esforços se deixaram ficar de meus desejos, porém nunca de minha habilidade. Meus intuitos pessoais só mereciam ser chamados de pessoais na medida em que tendiam para o bem da pessoa sacratíssima de Vossa Majestade e o bem do Estado. Por todas essas graças derramadas sobre mim, tão indigno e pequenino, só agradecimentos de vassalo vos posso dirigir e minhas preces ao céu por vós, assim como a lealdade muito própria, que tem sempre crescido e sempre há de crescer, até que a morte, esse inverno, a aniquile.

REI HENRIQUE — Bela frase; retrata um obediente e fiel súdito. A honra o recompensa, como o opróbrio; caso contrário, será o seu castigo. Penso que ao tempo em que com benefícios vos estendia a mão, sincero afeto por vós do coração se me expandia, honras do trono sobre vós chovendo, mais do que sobre outra qualquer pessoa. Por isso tudo, vossa mão, o cérebro, o coração e todas as partículas de vosso ser deviam — não por força dos deveres gerais da vassalagem, mas, por assim dizer, por um afeto muito particular — ser-me afeiçoados, a mim, o vosso amigo, mais que aos outros.

WOLSEY — Só sei dizer que sempre hei trabalhado mais para o bem de Vossa Majestade do que para o meu próprio. Assim fui sempre, assim sou e hei de ser. Embora todos os homens viessem a quebrar as juras que a vós os prendem, arrancando-as da alma; muito embora os perigos se amontoassem em maior quantidade do que pode representar o próprio pensamento, sob formas pavorosas me surgindo: ainda assim, qual penedo em meio às ondas impetuosas, o meu dever de súdito desviaria a torrente irresistível e se conservaria sempre vosso.

REI HENRIQUE — Palavras muito nobres. Tomai nota, senhores, que ele tem muito leal peito, pois o vistes aberto. Ora lede isto.

(Entrega-lhe uns papéis.)

E, em seguida, isto; e, após, o vosso almoço, se apetite tiverdes para tanto.

(Sai o rei, lançando um olhar colérico para o Cardeal Wolsey; os nobres se apressam a segui-lo, sorrindo e cochichando uns com os outros.)

WOLSEY — Que quer dizer tudo isso? Essa ira súbita? Como fui provocá-la? Ele afastou-se com o rosto carrancudo, parecendo dos olhos irradiar minha ruína. É desse modo que o leão furioso encara o ousado caçador; ferido, muito embora, o aniquila. É necessário que eu leia este papel. Temo que nele se ache a história de toda a sua cólera. É isso mesmo; esta folha aniquilou-me. É a relação do mundo de riquezas que eu amontoei para proveito próprio, especialmente para ver se a sede do papado alcançava, e meus amigos de Roma, assim, pagar. Oh negligência! digna de pôr um imbecil por terra! Que demônio maldoso me teria levado a colocar este segredo de tamanha importância no pacote que eu mandei para o rei? Não há recurso para remediar isto? Traça alguma que esta idéia do cérebro lhe tire? Sei que ele vai ficar muito abalado; mas um meio conheço, que no caso de ser bem aplicado — embora a sorte se possa opor — me tirará do aperto. Que será isto? “Ao Papa!” A própria carta que eu enviei a Sua Santidade! Por minha vida! Agora está acabado. Não há remédio. Já alcancei o ponto mais alto da grandeza, e desse pleno meridiano de minha grande glória baixarei apressado para o ocaso. Vou cair como um lúcido meteoro, que ninguém mais enxerga.

(Voltam os Duques de Norfolk e de Suffolk, o Conde de Surrey e o Lorde Camareiro.)

NORFOLK — Escutai o prazer do rei, cardeal. Entregar-vos ordena sem delongas em nossas mãos o selo e à casa de Asher vos recolher, à sede do bispado de Winchester, até novas mais precisas terdes de Sua Alteza.

WOLSEY — Alto! Onde se acham vossos plenos poderes? Só palavras nunca trazem tão grande autoridade.

SUFFOLK — Quem pode contrariá-las, se da boca do rei, diretamente, elas dimanam?

WOLSEY — Até que eu veja mais do que palavras, ou vontade somente e a falsidade que vos caracteriza, ficai certos, senhores oficiosos, que eu me atrevo, que eu devo contestá-las. Vejo agora de que metal grosseiro fostes feitos: de inveja. Com que empenho seguis todos minha desgraça, como se alimento dela mesma tirásseis! Que brandura, que maciez revelais em tudo quanto pode apressar-me a queda! Em vosso curso de inveja continuai, homens maldosos; os deveres cristãos vos dão apoio; mas há de vir o tempo em que, sem dúvida, sereis recompensados. Este selo que de mim reclamais com tanto empenho, o soberano — meu senhor e vosso — com suas mãos me deu, asseverando que em toda a minha vida eu gozaria do posto e dignidade a ele inerentes. E para sua generosidade deixar bem clara, confirmou o dito com suas cartas patentes. Assim sendo, quem se atreve a tomar-mo?

SURREY — O rei, que o deu.

WOLSEY — Que seja ele em pessoa, então.

SURREY — Não passas de um traidor arrogante, padre.

WOLSEY — Mentes, lorde atrevido! Há quarenta horas, Surrey preferiria ter queimado a língua a falar desse modo.

SURREY — Tua empáfia, ó pecado escarlate, esta chorosa terra privou do muito nobre Buckingham, meu sogro. Todas as cabeças, todas de teus irmãos cardeais, contigo e quanto tiveres de melhor, pesavam menos que um só cabelo dele. A peste leve toda a vossa política. Enviastes-me para a Irlanda, afastando-me da ajuda que podia prestar-lhe, do monarca, de quantos o teriam desculpado do crime a ele imputado, enquanto a vossa grande bondade, por piedade santa, o absolveu com um machado.

WOLSEY — Isso, e assim tudo quanto este lorde falador quisesse doravante assacar-me, afirmo, é falso. Por lei o duque recebeu seu prêmio. De como eu fui isento de maldade particular na queda dele, prova-o o nobre júri e a própria ação nefanda. Milorde, se eu gostasse de discursos muito compridos, ora vos diria que sois destituído tanto de honra como de honestidade e que a respeito de lealdade e verdade ao soberano — meu sempre leal senhor — me considero melhor homem que Surrey e que todos quantos suas loucuras aprovavam.

SURREY — Padre, essa roupa longa vos protege, por minha alma. Se não fora isso, havias de sentir minha espada no teu sangue. Podeis, milordes, continuar ouvindo por mais tempo tamanhas arrogâncias? E logo deste tipo? Se mostrarmos mansidão a esse ponto, que permita a um retalho escarlate fazer pouco de nós todos, então: adeus, nobreza! Que prossiga Sua Graça e vos enxote com seu chapéu, tal como a cotovias.

WOLSEY — Para esse estômago é veneno o mérito.

SURREY — Sim, mas o mérito de haver reunido por meio da extorsão toda a riqueza da terra em vossas mãos, cardeal; o mérito do embrulho interceptado, da missiva que para o papa contra o rei mandastes. Já que me provocastes, vosso mérito vai ficar conhecido à saciedade. Milorde de Norfolk, se é que de nobre família descendeis e fazeis caso do bem-estar de todos, da grandeza de nossa condição espezinhada, de nossos filhos que, dificilmente, se ele viver, virão a ser fidalgos, lede a lista de todos os seus crimes, o resumo de todos os seus atos. Muito mais assustado vou deixar-vos do que o sagrado sino, quando aquela rapariga morena em vossos braços se recosta, cardeal, e vos dá beijos.

WOLSEY Como eu podia desprezar este homem, se não fosse impedir-me a caridade!

NORFOLK — Milorde, a lista de seus crimes se acha com o próprio rei, mas basta que o declare: são todos horrorosos.

WOLSEY — Mais formosa com isso, e imaculada, há de mostrar-se minha inocência, quando o soberano conhecendo ficar minha lealdade.

SURREY — Isso não vai salvar-vos. Felizmente tenho boa memória; ainda me lembro de alguns itens da lista. Vou dizê-los. Se capaz de corar ainda fordes, cardeal, e de dizer “culpado” a tudo, um resto mostrareis de honestidade.

WOLSEY — Falai, senhor, pois desafio vossas acusações. Corar eu poderia, mas por ver um fidalgo que de todo perdeu a compostura.

SURREY — Antes perdê-la que perder a cabeça. E agora ouvi-me. Primeiro, sem que o rei tivesse tido ciência disso ou nisso consentido, conseguistes o posto de legado, com o que mutilastes os direitos de nossos bispos.

NORFOLK — A seguir, em tudo quanto escrevíeis para o rei e para príncipes estrangeiros, sempre usáveis a pretensiosa fórmula seguinte: “Ego et Rex meus” com o que do rei fazíeis um subalterno vosso.

SUFFOLK — Mais, ainda: sem ter o rei nem o Conselho ciência, quando de embaixador servistes junto do imperador, tivestes a ousadia de a Flandres carregar o grande selo.

SURREY — Item, poderes plenos de vós teve Gregório de Cassado, para um pacto firmar entre Ferrara e Sua Alteza, sem de nada saber o rei e o Estado.

SUFFOLK — Depois, por simples ambição, mandastes gravar vosso chapéu sagrado em todas as moedas do rei.

SURREY — Depois, enviastes somas enormes — deixo agora à vossa consciência os meios por que foram ganhas — para Roma comprar e abrir caminho para mais altos postos; isso tudo sob as ruínas do país inteiro. Há mais; porém por serem coisas vossas, são odiosas; não vou sujar a boca.

CAMAREIRO — Ó senhor! não façais pressão tão grande contra um homem que cai; é caridade. Às leis estão patentes suas faltas; que elas, não vós, se incumbam de puni-lo. Aperta-se-me o coração por vê-lo precipitado de tão grande altura.

SURREY — Por mim, perdôo-lhe.

SUFFOLK — Lorde Cardeal, eis o que o rei decide: tendo em vista que quanto ultimamente praticastes dentro deste país, na qualidade de legado, se encontra no domínio de um praemunire, contra vós se expressa uma ordem de confisco, relativa a tudo o que possuís, terras, castelos e quanto mais tiverdes, declarando-vos fora da proteção do soberano. Essa é a minha mensagem.

NORFOLK — E com isso a vossas reflexões vos entregamos, para vos reformardes. Quanto à vossa resposta de há momentos, obstinada, de não nos entregar o grande selo, o rei será informado e, certamente, vos agradecerá. E agora, adeus, meu pequenino e bom Lorde Cardeal.

(Saem todos, com exceção de Wolsey.)

WOLSEY — Adeus ao pouco bem que me votáveis. Adeus, um longo adeus a toda a minha grandeza. Esse é o destino de todo homem: hoje lhe nascem as folhinhas tenras da esperança; amanhã ele floresce, carregado ficando de honrarias; mas no terceiro dia vem a geada, uma geada mortal, e no momento preciso em que ele — quão simplório e calmo! — crê que sua grandeza está madura, ela a raiz lhe morde, caindo ele tal como agora eu caio. Aventurei-me como crianças que nadam com bexigas, durante estios vários num oceano de glórias, mas profundo em demasia. Minha vaidade, inflando-se ao extremo, arrebentou sob mim, ora deixando-me cansado e envelhecido no serviço, ao sabor de uma rude correnteza que para sempre acabará tragando-me. Glórias vãs deste mundo, pompas fúteis, tenho-vos ódio! O coração se me abre a novos sentimentos. Triste a sorte de quem depende do favor dos príncipes! Entre o sorriso a que ele aspira tanto, o aspecto prazenteiro do monarca, e sua ruína há mais angústia e medo do que na guerra ocorre ou nas mulheres. E quando a queda vem, quem cai é Lúcifer, privado da esperança.

(Entra Cromwell, com aspecto consternado.)

Que é que há, Cromwell?

CROMWELL — Para falar, senhor, não tenho forças.

WOLSEY — Como! Minha desgraça te consterna? Admitir teu espírito não pode que um grande homem decline? Estais chorando! Devo, então, ter caído de verdade.

CROMWELL — Como vai Vossa Graça?

WOLSEY — Bem, decerto; nunca fui tão feliz, bondoso Cromwell. Agora me conheço. No meu íntimo sinto uma paz que paira sobre todas as dignidades terrenas, uma consciência clara e tranqüila. Devo ao rei a cura; agradecido sou a Sua Graça, humildemente o digo. Destes ombros, por piedade, tirou pesado fardo que afundar poderia até uma frota: honra excessiva. Oh! que pesado fardo! É um fardo, meu bom Cromwell excessivo para quem põe no céu toda a esperança.

CROMWELL — Alegro-me por ver que Vossa Graça compreende a situação por essa forma.

WOLSEY — Penso que sim, convicto estando agora — graças à força que no peito sinto — de que suportarei mais sofrimentos e muito mais intensos do que quantos meus inimigos de ânimo mesquinho a me infligir se atrevam. Que há de novo?

CROMWELL — A novidade pior e mais penosa é a boa graça do rei terdes perdido.

WOLSEY — Deus o ampare!

CROMWELL — A segunda é que nomeado foi em vosso lugar Sir Tomás More; é o Lorde Chanceler.

WOLSEY — É um tanto súbita, parece-me, a ascensão; mas é pessoa de saber comprovado. Faço votos para que ele por muito tempo saiba conservar-se nas graças do monarca e a justiça aplicar segundo as regras imparciais do dever e da consciência. Desse modo seus ossos, quando o curso completado ele houver e já se achar na bem-aventurança adormecido, alcançarão um túmulo banhado nas lágrimas dos órfãos. Há outras novas?

CROMWELL — Cranmer voltou e foi bem recebido; foi nomeado Arcebispo de Cantuária.

WOLSEY — Oh! isso é novidade!

CROMWELL — Finalmente, que Lady Ana, com quem muito em segredo havia muito tempo, o rei casara, hoje foi vista em público, quando ia para a capela real, sendo tratada como rainha. Só se fala agora em sua coroação.

WOLSEY — Foi esse peso que me jogou por terra. Oh Cromwell, Cromwell! O rei se me escapou. É para sempre, para sempre que eu perco minhas glórias nessa única mulher. Jamais o sol voltará a proclamar minha grandeza nem a doirar de novo os novos grupos que sempre meus sorrisos aguardavam. Afasta-te de mim, bondoso Cromwell; sou um pobre homem decaído, indigno de ser agora teu senhor e mestre. Vai procurar o rei. Jamais ocaso há de ter este sol, é o que desejo. Quem és lhe disse e quanto verdadeiro. Decerto há de ajudar-te. Algum resquício de consideração a meu respeito — conheço-lhe a alma nobre — há de impedi-lo de apagar teu serviço meritório. Bondoso Cromwell, não te esqueças dele; cuida de teu futuro, promovendo tua estabilidade.

CROMWELL — Ó meu senhor! Vou deixar-vos? Forçoso é, então, que eu perca tão bondoso senhor, tão leal e nobre? Atestem-me as pessoas que de ferro não têm o coração, em como é cheio de tristeza que Cromwell se despede de seu senhor e mestre, O soberano meus serviços terá; mas minhas preces sempre vossas serão, oh! sempre, sempre!

WOLSEY — Cromwell, nunca pensei que uma só lágrima viria a derramar em minha queda. Mas com tua lealdade e singeleza ao papel de mulher me reduziste. Enxuguemos os olhos. E ora escuta-me. Quando esquecido eu já estiver — que é certo vir a sê-lo — e dormir no frio mármore, quando ninguém pronunciar meu nome, dirás que eu te mostrei, dirás que Wolsey — que as estradas da glória percorrera e os abismos sondara mais profundos e as sirtes do comando — em seu naufrágio te mostrou o caminho da grandeza, o caminho seguro e confortável que ele próprio perdera. Observa apenas minha queda e o que fez minha ruína. Despe-te de ambição, Cromwell, te peço. Esse pecado derrubou os anjos; como útil poderia ser aos homens, de Deus feitos à imagem? Não reveles egoísmo; ama aos próprios inimigos. Não lucrarás por meio do suborno mais do que com a verdade. Traze sempre na destra a doce paz, pala que as línguas invejosas reduzas ao silêncio. Se justo e nada temas. Que tuas metas se identifiquem sempre com as da pátria, de Deus e da verdade, pois, ó Cromwell! no caso de caíres, tua queda será a de um grande mártir. Serve ao rei e, por obséquio, deixa-me. O inventário farás de tudo quanto tenho, tudo, até o último pêni; ao rei pertence. Minha lealdade ao rei e minhas vestes é tudo o que me resta. Ó Cromwell, Cromwell! Se ao meu Deus eu tivesse revelado metade, só, do zelo com que sempre servi o soberano, ele decerto não me teria, nesta idade, entregue nu aos meus inimigos.

CROMWELL — Meu bondoso senhor, tende paciência.

WOLSEY — Tenho muita. Esperança da corte, agora, adeus; minha esperança se concentra em Deus.

(Saem.)

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